Mo Kolours - EP1: Drum Talking


De Londres faz-se ouvir mais uma prova de que o multiculturalismo, na dimensão musical, funciona (e de que maneira). Duvida-se que alguém pudesse pilhar lojas, agredir a polícia, ao som das encantatórias "Biddies" e "Bakiraq".
Metade-mauritano, metade-inglês, Joseph Deenamode é um parte percussionista, parte cantor, parte aspirante a produtor e perfeito maluquinho da música (o próprio dixit).
Ouvindo-se o EP de estreia "Drum Talking" (de escuta gratuita aqui ), fica-se com a impressão duradoura de que o iPOD de um adolescente viciado em J.Dilla, Fela Kuti, Oneness of Juju, Francis Bebey, Tony Allen e afins do afrobeat, foi invadido pela alegria serena da Sega ( "Segá" na pronúncia original), mistura de ritmos africanos e europeus, normalmente cantada em kreol maurysen, um crioulo que aldultera a língua francesa e a língua mais falada na ilha- imiscuindo-se em modo shuffle nos próprios beats ocidentais, fazendo-os mais preguiçosos, sentando-se no lugar do rapanço confiante e despreocupado de um Common, das ruminações psicotrópicas pelo deserto do Real, de um Gonjasufi, de um roots reggae de meados de 70s do século passado, ou do voluptuoso voodoo vocal de uma Erykah Badu ou de um D´Angelo. E o que se ouve é música: tal como a devíamos conhecer. sem fronteiras, de credo, estatuto ou cor. O que se ouve é amor, servido numa paleta polifónica impressionista, tão vasta quanto é esta vida que nos acolhe. Cada faixa uma instalação cósmica (como de resto acontece na fantástica capa-quase-mural do disco, a cargo, como todo o artwork original, do pintor sueco Ekta), com sonzões, sons e sonzinhos que pintam um onírico passeio venareante sem fim.
As supra mencionadas tribais digitais "Biddies" e "Bakiraq" ( lendo-se Bacharach, como o nome do tremendo compositor norte-americano), a beatlesca "Dead of Night" (espelhando igualmente algumas malhas de Ambivalence Avenue, de Bibio), o workout percussivo "Drum Talking" e a deliciosamente divertida " 8 Hours", num encontro imaginado entre Steve Spacek e Theo Parrish, estrelam qualquer firmamento. Drum Talking é uma leitura aleatória mas atenta, pelas notas do moleskine de um etnomusicólogo.



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